No Brasil, 49% das empresas estão reduzindo seus investimentos em inteligência artificial. O dado é de um estudo realizado pela Qlik com 4.200 C-levels. Veja: praticamente metade das organizações estão tirando seu time de campo – ou jogando na retranca – em relação a adotar a tecnologia considerada “a bola da vez”.
Mas o que aconteceu?
A resposta passa por vários fatores, mas o principal deles já havia sido apontado em um artigo que escrevi há pouco mais de um ano: faltam KPIs concretos e estratégia adequada para adotar a inteligência artificial. Se uma organização emprega uma tecnologia sem saber claramente o que pode esperar dela, como será capaz de medir seus resultados? Não será, obviamente. Se o objetivo não é claro, tampouco haverá métricas para acompanhá-lo.
Boa parte das empresas adotaram a inteligência artificial sem saber quais os problemas complexos que ela poderia resolver em suas operações. Também não levaram em conta questões desafiadoras inerentes à essa tecnologia, como ter um volume significativo de dados confiáveis para trabalhar, ou mesmo aspectos regulatórios para sua adoção. O resultado é que restringiram a IA a aplicações mais corriqueiras (chatbots, geração de textos, e por aí vai), que nem mesmo eram aquelas das quais as empresas realmente se beneficiariam
Pra quê serve?
Inteligência artificial não é algo barato. O custo para adotá-la e desenvolver sua aplicabilidade é considerável. Porém, o hype em torno dela foi tão forte que muitas diretorias autorizaram investimentos sem antes fazer provas de conceito, ou mesmo definir a usabilidade da tecnologia.
Ao mesmo tempo, poucas são as organizações que contam com especialistas em IA em suas fileiras. É compreensível: embora não seja nova, a tecnologia não tinha prioridade no universo corporativo até poucos anos atrás. Porém, a rápida ascensão do chatGPT junto ao grande público acendeu um sinal de alerta nos conselheiros e acionistas: eis aqui uma novidade intuitiva, de adesão rápida e com grande potencial de mercado. Por que não investir?
Claro que tal investimento podia (e pode) ser uma boa ideia – desde que se tenha claro o seu propósito. Como a maior parte das companhias foram mal orientadas (ou não receberam orientação alguma), acabaram fazendo uso da IA onde parecia mais óbvio ou conveniente, e não necessariamente onde ela poderia trazer resultados.
Você pode perguntar: “mas e a Meta? Ela anunciou a demissão de 4 mil funcionários para poder focar na contratação de profissionais capacitados em IA e aprendizado de máquina. Cadê o recuo do mercado?”
De fato, a gigante tecnológica fez esse anúncio, mas é preciso entender duas coisas para além da manchete. A primeira é que 4 mil não representa nem 10% dos quase 72 mil colaboradores efetivos dessa big tech no mundo. A segunda é que, pela natureza do seu negócio, a Meta tem aspectos meramente operacionais que podem, sim, ser realizados por uma inteligência artificial bem aplicada.
Em uma empresa dessa natureza, áreas de suporte, atendimento e checagem de informações podem ser otimizads com aplicação de IA em larga escala. Outras companhias não têm essa característica, e se beneficiariam muito mais se a tecnologia fosse aplicada em outros usos. Mas quais?
Hora de embarcar
No mesmo artigo em que falei dos KPIs, sinalizei também que a IA seria mais útil tanto mais quanto fosse embarcada em dispositivos e aplicações. Um exemplo bastante evidente são as câmeras de vigilância que, por meio da inteligência artificial, podem identificar comportamentos suspeitos dos frequentadores de lojas do varejo. Imagine o quanto algo desse tipo pode economizar para uma rede de supermercados, reduzindo perdas e auxiliando a equipe de segurança patrimonial. Ou melhor, não imagine: faça cálculos e projeções que permitam ter a dimensão real da economia proporcionada.
Pense, ainda, em ERPs que podem fazer uma integração verdadeiramente inteligente com auxílio da IA. Sistemas contábeis e fiscais com inteligência artificial embarcada, capazes de detectar fraudes e desvios com mais assertividade. Modelos de segurança da informação que contam com essa tecnologia para autorizar ou negar permissões com mais rapidez e assertividade, garantindo proteção ao sistema com uma agilidade que os modelos tradicionais não são capazes de proporcionar.
Nenhuma dessas soluções é uma projeção para o futuro: todas estão disponíveis, e muitas empresas tirariam grande proveito de seu uso. Mas para tanto, é preciso fazer a lição de casa, estudando as reais necessidades a organização e analisando o que o mercado oferece a ela.
A empolgação e o marketing em torno da IA fizeram muitos C-levels (e não só eles) se iludirem, acreditando que haveria um boom revolucionário em termos de desempenho, redução de custos e afins. Porém, sem conhecer o que estavam comprando, fizeram projetos mal direcionados, com resultados decepcionantes. Outras até estavam bem capacitadas em termos de pessoal qualificado, mas estabeleceram prazos e condições inviáveis para a adoção da novidade. Tampouco colheram bons frutos.
Porém, mesmo quem já investiu pode realizar uma correção de rota. Tudo vai depender, claro, do valor investido até o momento. As empresas podem realizar um estudo mais aprofundado sobre o que estava sendo desenvolvido versus o que elas realmente precisam. Em outras palavras, pode ser um bom momento de realizar um estudo de caso em cima de projetos e hipóteses plausíveis, e não mais seguir a manada.
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