Todo mundo que já passou tanto por uma entrevista para uma vaga de trabalho em uma startup quanto por um processo seletivo em uma empresa maior sabe a diferença entre os dois mundos. Essa diferença não é apenas superficial, mas se estende ao que ambas as empresas buscam em potenciais funcionários.
A minha experiência, enriquecida por entrevistar e ser entrevistado em diversos ambientes, me mostrou que o que costumava funcionar em uma big corp nem sempre era um ponto positivo em uma entrevista em uma startup. O contrário também é verdadeiro, evidenciando uma dissonância interessante entre as expectativas e valores de diferentes tipos de organizações.

Recentemente, a renomada aceleradora Y Combinator publicou um guia abrangente sobre como se preparar para uma entrevista em uma startup. Uma das recomendações mais marcantes foi a de fazer perguntas relevantes. Eles apontam, de forma incisiva, que “escutaram dos fundadores que os candidatos geralmente não fazem perguntas perspicazes e, como resultado, parecem não estar particularmente entusiasmados ou engajados.”
A peculiaridade de uma startup, que geralmente possui um ambiente dinâmico e tolerante a falhas, se manifesta na forma como ela pode valorizar profissionais que estão mais acostumados a lidar bem com mudanças, desde aquelas de última hora até as menos impactantes.

Uma pergunta característica que costuma aparecer em uma entrevista para uma vaga em startup é: “o que você mais gosta e o que menos gosta no dia a dia da sua empresa atual?” Outra que pode surgir é: “me conte uma empresa e os motivos pelos quais você gostou de trabalhar e onde você não gostou tanto assim.” Essas perguntas, aparentemente simples, mas profundamente reveladoras, ajudam a mapear como o candidato descreve o excesso ou a falta de planejamento, o que faz ele se sentir entusiasmado ou desanimado, e, por fim, o que ele valoriza em uma empresa.
Eu já entrevistei pessoas que descreveram como pontos positivos empresas super planejadas e organizadas, onde o contato entre Produto e Tecnologia era pontual e ocorria somente nos inícios e fins de sprint. Essa abordagem, embora adequada em alguns ambientes, pode ser um tiro no pé do candidato em uma startup. O que se busca com esse tipo de pergunta é entender se as experiências anteriores do candidato contemplam tolerância a erros e a planejamentos mais fluidos, características intrínsecas a muitas startups.
Minha experiência me levou a entrevistar centenas, ou até milhares de pessoas. Dessa vasta gama de indivíduos, posso afirmar: existem pessoas que se entusiasmam com correções de rota, assim como os que não gostam e até as evitam. A habilidade de lidar com a incerteza e a mudança é frequentemente uma qualidade apreciada em um candidato a uma vaga de startup.
Outro ponto que é crucial em uma entrevista de emprego é o candidato não saber justificar decisões técnicas. A clareza de pensamento e a capacidade de sintetizar ideias complexas são fundamentais em um ambiente em rápido movimento.
O grande Filipe Deschamps, um respeitado nome no campo de Tecnologia e Startups, detalha essa e outras recomendações no vídeo a seguir:
A importância por trás de saber explicar uma decisão técnica é imensa, especialmente em uma startup. Correndo o risco de soar clichê, é preciso enfatizar que todos os desenvolvedores precisam ser protagonistas, principalmente nas fases iniciais da empresa. Um desenvolvedor que não consegue explicar os racionais por trás de decisões técnicas anteriores indica se tratar de um profissional que está mais acostumado a seguir direcionais e guides de outro profissional mais sênior. Em uma startup enxuta, onde a colaboração e a iniciativa são vitais, isso certamente é um ponto negativo.
Em entrevistas em empresas maiores, por outro lado, é comum que não haja tempo para que os detalhes técnicos de outras experiências sejam explicados em profundidade. O recrutador, frequentemente pressionado pelo tempo e pela necessidade de cobrir um vasto checklist, pode se concentrar em questões mais gerais. Isso por vezes obriga o entrevistado a ter uma postura mais passiva, um contraste marcante com a abordagem mais colaborativa e interativa encontrada em muitas startups.
Um artigo da Undercover Recruiter aprofunda esse contraste, citando que “de fato, não é incomum que um entrevistador de startup faça de 2 ou 3 perguntas e depois dê a palavra para o entrevistado”, o que abre caminho para o candidato dar mais contexto e aprofundar o que achar necessário.

Outra característica que costuma ser valorizada em empresas maiores, mas que pode ser menos apropriada em uma startup, é o excesso de “nós fizemos” ao invés do “eu fiz/ meu papel foi”. Em uma startup, o que se busca em um desenvolvedor é entender a real contribuição individual dessa pessoa na entrega de um projeto. Quando eu entrevisto uma pessoa, eu busco entender qual foi o impacto que ela gerou nas entregas daquele time. É esse impacto, essa capacidade de contribuição individual, que será, com esperança, replicado pelo candidato na nova startup.
Por fim, um profissional orientado a novas tecnologias e linguagens hypadas não combina com uma startup. Em uma startup a tecnologia precisa ser meio, não fim. O mais importante será a capacidade do time em utilizar qualquer que seja a stack para resolver problemas reais, de pessoas reais. Quando um desenvolvedor menciona que está procurando um novo lugar para experimentar novas tecnologias, e que procura novos desafios seguindo essa linha de raciocínio, a bandeira amarela é levantada pelo recrutador e é provável que essa pessoa seja reprovada no processo seletivo.
Os pontos acima trazem uma visão combinada de artigos que listam dados e fatos com a minha experiência. Como tudo na vida, não existe o 100% certo e nem o 100% errado, porém posso garantir que, caso você, candidato, se atentar aos pontos acima e se preparar de antemão para a entrevista, as suas chances de ser aprovado em uma startup aumentarão significativamente.
Por Bruno Cabuto.
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